Um dos enredos mais interessantes da primeira versão de Renascer, da TV Globo, não terá espaço no remake de Bruno Luperi — pelo menos, não como foi em 1993. A personagem Buba, que originalmente era uma pessoa intersexo — se apresentava como mulher e possuía caracteríscas do corpo masculino, como o órgão genital — é uma mulher transexual na atual versão, sendo interpretada pela atriz trans Gabriela Medeiros.
Apesar de dar mais visibilidade às pautas das pessoas transexuais e de abrir espaço para uma atriz trans, a decisão tem sido criticada por pessoas intersexo, que acreditam ser alvo de um apagamento pelo autor do remake.
“É muito triste fazerem esse apagamento da única personagem intersexo que já teve em uma novela brasileira”, afirmou Thaís Emília Campos dos Santos, presidente da Associação Brasileira Intersexual (Abrai), ao portal Heloisa Toplan.
“A gente tem recebido inúmeras queixas e angústias de pessoas intersexo desde que foi anunciado que a Buba não seria mais assim. Por que não fazê-la trans intersexo, por exemplo?”, questionou a porta-voz.
Novas referências
Felizmente, apesar do enredo original de Buba ter ficado de fora no folhetim, pessoas intersexo contam atualmente com outras referências para seguir e se informar. A influenciadora brasileira Karen Bachini, por exemplo, revelou ser uma pessoa intersexo no ano passado, e esclareceu os seguidores sobre sua experiência.
Karen contou que possui os genitais e órgãos internos referentes ao sexo feminino, mas não produz hormônios. A influenciadora ainda explicou que, aos 18 anos, descobriu que além de um ovário pequeno também não tinha glândulas mamárias.
“Naquela época, me foi dito que eu tinha menstruado em alguma parte da minha vida e entrei na menopausa. Mas eu sempre achei isso muito estranho porque, se eu tivesse menstruado, eu saberia”, contou.
Logo depois, a jovem se submeteu a uma hormonização feminina e revelou que, ao parar de tomar hormônio, perde as características femininas, como o volume dos seios.
Nascer com características de ambos os sexos já é uma situação, por si só, muito complicada e a dimensão do problema é ainda maior quando a gente para pra pensar em um outro detalhe: a incidência de mutilação genital na infância. Foi isso que aconteceu com a modelo belga Hanne Gaby Odiele, que teve seu gênero “escolhido” pelos pais. Aos 10 anos de idade , ela teve os testículos removidos e passou por uma operação para reconstituir sua vagina.
“Eu tenho orgulho de ser intersexual, mas tenho raiva de que essas cirurgias ainda aconteçam”, disse Odiele ao USA Today, em 2020.
A cantora australiana Blume cresceu como uma menina até aos 16 anos, quando questionou a seu médico o porquê de nunca ter entrado na puberdade. A resposta, após exames detalhados, impressionou a artista: ela não tinha uma vagina completamente formada e foram encontrados testículos internos.
Em 2022, São Paulo elegeu a primeira deputada intersexual de sua história: Carolina Iara (PSOL). A parlamentar também passou por processos de mutilação na infância e adolescência. “Uma vez, quando eu tinha seis anos, estava chorando durante esse processo de cirurgias, e minha avó foi reclamar para o médico. Ele foi estúpido e gritou dizendo que dava muito trabalho produzir um negão e que negão não tinha que chorar por dor”, contou.